O tom de reclamação imposto ontem pela governadora Wilma de Faria (PSB) durante a leitura da mensagem anual na Assembleia Legislativa, ontem, 16, poderá representar um recado explicito da governadora às pretensões de Robinson Faria (PMN), presidente daquela Casa de Leis, que pretende ser candidato ao governo do Estado, e o pedido do presidente Lula da Silva para que ela apoiasse a candidatura do deputado federal Henrique Eduardo Alves a sua sucessão em 2010, feito durante uma viagem de helicóptero na semana passada, de Ceará - Mirim para Natal.
O recado foi dado em vários momentos da fala da governadora, quando ela reclamou das modificações feitas pelos parlamentares: "Desejo ressaltar a importância da harmonia dos poderes (...) Alerto a todos os parlamentares que as mudanças feitas na Lei do Orçamento Estadual desconfiguraram pontos importantes para a nossa administração (...) A crise financeira mundial se agravou e temos que manter o pleno funcionamento do Estado (...) O ano de 2009 será dedicado à administração para melhorar a vida do povo (...) A política eleitoral estará fora de minha pauta este ano (...) A pressa em política pode representar um retrocesso das soluções (...) Caminharemos para a vitória em favor de um novo Rio Grande do Norte, mas repito, não é hora agora de política eleitoral (...) O governo precisa administrar sem amarras".Logo em seguida a fala da governadora, o presidente da Assembleia Legislativa quebrou o protocolo para responder de forma altiva.
"A senhora não sofreu uma só derrota neste plenário. Em nenhum momento os deputados tentaram obstacular o Rio Grande do Norte, porque respeitamos o governo Wilma de Faria, mas esperamos, da mesma forma, o mesmo respeito", sentenciou.Robinson usou da máxima de que 'ninguém recebe ninguém em sua casa para receber críticas'. E, ele sabe que a governadora do Estado não aceita críticas e talvez por isso mostrou-se com a mesma característica, após o imbróglio causado por causa da poda que a Assembleia fez com a rubrica que deixava livre um percentual significativo para transporte de verbas de uma pasta para outra, conforme a vontade do governo, ou necessidade.
Wilma ficou completamente insatisfeita porque isso quebra a dinâmica do governo para realizar adaptações financeiras consideradas normais pelos gestores públicos e o evento da troca de farpas está sendo considerado como um dos mais importantes da política do Rio Grande do Norte com relação à pavimentação das eleições de 2010, porque Robinson Faria era quem sempre estava ao lado de Wilma.
Ele sabe que não seguirá Lula, que quer a candidatura de Henrique Eduardo apoiado por Wilma, numa repetição do quadro de 2008, quando a governadora seguiu a orientação de Lula e o desejo de Carlos Eduardo Alves, para apoiar Fátima Bezerra (PT) para concorrer a Prefeitura Municipal de Natal. Depois dos discursos de ambos, as farpas continuaram, quando Wilma provocou:- Convoque uma Audiência Pública, vamos ao debate.- Vamos ao debate! Respondeu Robinson Faria.Depois, as conversas de bastidores davam conta que Robinson estaria disposto, motivado pela irritação, a sair candidato até mesmo sem o aval de Wilma de Faria, que não gosta de ser contrariada.
Robinson poderá ter dado o "start" para Wilma apoiar Henrique, ser o alvo histórico de sua mágoa, mas ela depende dele para aprovar projetos importantes na Assembleia Legislativa. Nesse momento a situação é séria e Iberê Ferreira, o vice-governador, que não se manifestou, foi o único vencedor da confusão. O 'candidato natural' faturou um espaço que não esperava, caso Wilma não atenda a Lula. Ficou mais 'natural' do que nunca."O Executivo estipula e o Legislativo tem o direito de discordar", diz Wagner Araújo
O Secretário de Planejamento do Governo do Estadual, Wagner Araújo, explicou hoje durante entrevista a uma emissora de rádio da capital que o remanejamento de verbas era importante de uma rubrica para outra. "O Orçamento do Estado é uma Lei que é aprovada todos os anos, para vários setores. O executivo estipula e o legislativo tem o direito de discordar e fazer modificações; este ano a Assembleia fez várias alterações, mas a Lei do orçamento tem uma série de requisitos estabelecidos pelo governo federal que estipula, por exemplo, 25% para a Educação, 12% para a Saúde, 60% para despesas com pessoal e por aí vai... A Assembleia tem também que se adequar às normas constitucionais e por isso a governadora vem tentado conversar com o poder legislativo para poder organizar essas obrigatoriedades que ela tem que respeitar", ensinou.
E, com relação à afirmação do presidente Robinson Faria, que afirmou ter a Assembleia mexido em apenas R$ 50 milhões do total de R$ 7 bilhões do orçamento, o secretário discordou. "Na verdade a AL mexeu em 68 milhões. O fato é que a AL tem esse direito, mas tem normas a serem cumpridas e se o poder legislativo retirar dinheiro de algumas ações, obras ficam comprometidas. Por exemplo, a reconstrução da ponte que caiu em Macau e que praticamente isolou a cidade. A ponte está em obras e foi tirado dinheiro da construção da obra; é como se a Assembleia tirasse dinheiro da obra para outra coisa.
Eu acho até que a forma como esse orçamento ser debatido termina fazendo com que nem todos os deputados compreendam bem o teor da questão. Mas, essa é uma situação que pode ser resolvida mediante o diálogo entre os poderes", enfatizou. "Desde Montesquieu nos idos de 1740, quando o filósofo estabeleceu a harmonia entre os poderes, pressupõe o debate em torno da democracia. Mas, mesmo diante desse inusitado, em que houve o imbróglio, logo em seguida Robinson Faria e Wilma voltaram a se encontrar na missa de aniversário dela e depois, no mesmo carro, viajando para J Câmara e Jardim de Angicos", disse.(O secretário se referiu à obra de Montesquieu "A Teoria da Separação dos Poderes" contida no livro O Espírito das Leis (1748), que visou moderar o Poder do Estado dividindo-o em funções, e dando competências a órgãos diferentes do Estado).
Matéria Publicada no Correio da Tarde ( na íntegra).