Imagem: Divulgação (Joel Dias)

Eu quero dizer que fui prefeito e fui secretário de Garibaldi e nunca fui envolvido em nenhum escândalo de corrupção. Nenhuma denúncia de improbidade ou de irregularidade”. A declaração do ex-prefeito, Carlos Eduardo Alves, que é candidato do PDT a Prefeitura de Natal neste ano, soou confusa não apenas para os ouvintes do Jornal 96, da 96 FM (onde ela foi proferida), que têm conhecimento da condenação que ele sofreu na Câmara Municipal de Natal em maio deste ano. Soou distante da realidade, também, para os poucos que sabem que, na verdade, Carlos Eduardo é apontado como um dos responsáveis por um prejuízo de cerca de R$ 6 milhões aos cofres públicos ao assinar – e pagar – 129 contratos supostamente irregulares. O caso, que agora virou processos no Tribunal de Contas da União (TCU), é da época em que o ex-prefeito era secretário de Estado, da Justiça e da Cidadania (SEJUC), em 1999. Por isso, atualizado e corrigido, o valor do desfalque pode chegar aos R$ 45 milhões.
A denúncia ainda é pouco conhecida por boa parte da população, inclusive, pelo tempo que tem. Depois de deputado estadual, eleito pelo PMDB, Carlos Eduardo assumiu durante a administração do primo, Garibaldi Alves Filho, então governador, a SEJUC, onde assinou uma série de contratos com diversas entidades para a realização de cursos de capacitação de profissionais.
Os recursos para a realização deles chegavam por meio do Ministério do Trabalho e Emprego e, por isso, passaram por auditorias feitas pela Secretaria de Políticas Públicas de Emprego, órgão de controle do Ministério. E foi, justamente, nessa Secretaria, por meio de uma Tomada de Contas Especial (TCE) que constatou, em 2005, as irregularidades em muitos desses contratos. Desde o não cumprimento integral, até a impossibilidade de qualquer comprovação de que o curso realmente existiu.
De posse de informações de parte desse processo criado no Ministério do Trabalho, O Jornal de Hoje retrata: a Comissão de Tomada de Contas Especial (TCE) designada por meio da portaria número 44, mais precisamente de 4 de agosto de 2005, objetivava “investigar a aplicação de recursos públicos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), repassados ao Estado do Rio Grande do norte por meio do convênio MTE/SEFOR/CODEFAT número 007/99 – SEJUC/RN e termo aditivo número 001/00, ao já citado convênio, identificando os responsáveis e quantificando os danos causados ao erário, havendo formalizado o processo supramencionado e tendo ultimado a apuração dos fatos mediante minucioso exame das provas objetivas e subjetivas, que culminaram com as análises em 129 contratos”.

Em 2012, sete anos depois da constatação das irregularidades, começaram as denúncias contra a gestão do ministro Carlos Lupi, do PDT, mesmo partido de Carlos Eduardo Alves, no Ministério do Trabalho. O ministro caiu (assumiu Brizola Neto, também do PDT, e que já participou da campanha do ex-prefeito em Natal, neste ano) e o que a Comissão Especial constatou, finalmente, chegou ao TCU. Foi transformado em processos (cada contrato irregular virou um) e, em setembro deste ano, o Tribunal intimou os envolvidos, inclusive, o ex-prefeito de Natal para se explicar.

Imagem: Novo Jornal / Site do candidato
E houve alguma mudança no teor das irregularidades encontradas? Não. O que o Ministério do Trabalho encontrou e ainda não tinha passado para o TCU é basicamente o mesmo que está no processo agora que tramita na Corte de Contas, nas mãos do relator, o ministro Aroldo Cedraz de Oliveira. O que mudou mesmo foi o valor do suposto dano ao erário: de R$ 6 milhões em 1999, a quantia pode chegar a cerca de R$ 45 milhões neste ano.

Enfim, quais seriam essas irregularidades? As mais variadas possíveis, como “vícios graves na habilitação, na aprovação de projetos e na contratação, os quais contribuíram para inexecução ou execução parcial dos contratos”. Segundo a Secretaria de Políticas Públicas de Emprego também, em documento assinado pelo presidente da Comissão de Tomada de Contas Especial (TCE), Rijóse Madruga Freire, foi possível constatar a autorização ou ordenamento de “pagamentos sem cumprimento das exigências legais e contratuais para comprovação de execução”.
Também foi possível a “omissão no dever de acompanhar, de controlar e de fiscalizar a execução dos serviços contratados e a efetiva aplicação dos recursos”, e a “não comprovação da execução integral, em função da ausência de documentos comprobatórios exigidos nos contratos” (veja a lista completa das irregularidades no quadro abaixo).
Na citação da abertura do processo (identificado pelo número 1117/2012-TCU/SECEX-RN), o TCU alerta para o fato de que o não atendimento dela, no prazo ora fixado, implicará que o citado seja considerado revel pelo Tribunal, para todos os efeitos, dando-se prosseguimento ao processo, nos termos do 3º do artigo 12 da Lei 8.443/92. Eletronicamente, já foi possível constatar que o ex-prefeito Carlos Eduardo já recebeu a intimação da abertura do processo.
“Informo também que o julgamento do processo acima referido poderá ter reflexo no julgamento de eventuais contas anuais do responsável que tiver suas alegações de defesa rejeitadas pelo Tribunal”, conforme escreveu o secretário substituto do TCU, Cleber da Silva Menezes.
“Ressalto que o recolhimento tempestivo do débito, somente poderá evitar a condenação pela irregularidade das contas, caso seja reconhecida pelo TCU a boa-fé do envolvido e não tenha sido constatada outra irregularidade nas contas. De outro lado, saliente que a rejeição das alegações de defesa pelo Tribunal poderá, ainda, ensejar a aplicação de multa prevista”.
E mais: “caso verificada a ocorrência de fraude à licitação, o Tribunal poderá declarar a inidoneidade do licitante fraudador para participar, por até cinco anos, de licitação na Administração Pública Federal”.


Irregularidades apontadas pelo ministério do trabalho

Vícios graves na habilitação, na aprovação de projetos e na contratação, os quais contribuíram para inexecução ou execução parcial dos contratos, a saber:

- Utilização do expediente da dispensa de licitação para habilitar e contratar diretamente entidades executoras como também a contratação de entidades com inexigibilidade de licitação sem justificativas, no âmbito do Programa Estadual de Qualificação (PEQ/1999), não observando os preceitos da Lei 8.666/93;
- Ausência de divulgação de regras editalícias para seleção e habilitação de entidades executoras do PEQ/1999, descumprindo-se o artigo 40 da Lei 8.666/93;
- Contratação de entidades executoras com descumprimento no disposto no artigo 2º da resolução número 194 de 23/09/98;
- Aprovação de projeto e contratação de entidades que não comprovaram capacidade técnica e estrutural para executar ações no âmbito do PEQ/1999, com inobservância dos artigos 27 e 31 da Lei 8.666/93, contribuindo para inexecução ou execução irregular das ações contratadas;
Autorizar e/ou ordenar pagamentos sem cumprimento das exigências legais e contratuais para comprovação da execução;
Atestar execução de serviços sem a apresentação de instrumentais e relatórios exigidos no contrato e/ou sem comprovação de execução das ações;
Omissão no dever de acompanhar, de controlar e de fiscalizar a execução dos serviços contratados e a efetiva aplicação dos recursos, em inobservância do artigo 63 da Lei 4.320/64, contribuindo para a inexecução ou execução irregular das ações contratadas;
A não comprovação da execução integral, em função da ausência de documentos comprobatórios exigidos nos contratos, conforme relatório de análise indicado no respectivo quando constante desta citação;
A não comprovação, pelas entidades contratadas, da aplicação integral dos recursos repassados em função da ausência de documentos comprobatórios (guias de recolhimento do INSS e ISS; recibos de aquisição e entrega dos vales refeição e transporte; recibos de pagamento aos instrutores);


Carlos Eduardo pagou R$ 6 milhões em contratos duvidosos
Pesca, agricultura, comércio, artesanato. Os contratos assinados por Carlos Eduardo Alves quando ele era secretário da SEJUC foram os mais variados possíveis e representariam uma boa gestão caso não fossem questionados pelo TCU por suspeitas de irregularidades. E vale ressaltar que os contratos, na época, sem atualização, já não eram “baratos”. Só o do MEIOS, por exemplo, causou um dano ao erário de R$ 411 mil, segundo a Tomada de Contas Especial.
Entre os contratos questionados, estão os assinados para trabalhadores da: Assessoria e Consultoria S/C; Associação Comercial e Industrial da Micro e Pequena Empresa; Associação Comunitária dos Trabalhadores Avulsos e Artesãos de Augusto Severo; Associação Brasileira de Enfermagem; Associação Brava Gente; Associação de Apoio às Comunidades de Campo do RN; Associação de Atividades de Valorização Social (Ativa); Associação de Orientação aos Deficientes (ADOTE); Associação Potiguar de Educação e Cultura (APEC); Cooperativa de Profissionais Universitários Prestadores de Serviços (PROUNI); Fundação de Educação da Criança e do Adolescente (FUNDAC); e Instituto de Assistência Técnica e Extensão Rural (EMATER), entre outros.
Nos maiores prejuízos ao Erário, estão o da Cooperativa de Assistência, Consultoria e Apoio à Gestão Empresarial (COOGEST), que custou R$ 234,6 mil e teve um dano integral aos cofres públicos, segundo o Ministério do Trabalho; e a Cooperativa Sistema Integrado de Trabalho (COOSITRAB), no valor de R$ 199,2 mil (também um prejuízo integral).
Dano consideravelmente alto também foi para o contrato firmado para trabalhadores da Fundação de Apoio à Educação e Desenvolvimento Tecnológico do RN (FUNCERN), no valor de R$ 214 mil. Para a Fundação Cidadania (FUNCIDAD), a SEJUC assinou um contrato de R$ 182 mil que também causou, integralmente, prejuízo ao Erário.
Nem todos, porém, deram apenas danos ao erário. Na lista, é possível encontrar o contrato afirmado com o Sindicato dos Empregados em Estabelecimentos Bancários, que custou R$ 50,8 mil, mas causou zero de prejuízo aos cofres públicos. O valor do prejuízo também está em branco para o contrato com a Associação dos Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE), que custou R$ 5,9 mil; e o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Sócio-Econômico (DIEESE), no valor de R$ 150 mil.
OUTROS NOMES
Claro que Carlos Eduardo Alves, enquanto titular da SEJUC, não foi o único chamado pelo TCU para se defender. Tanto foi assim que na lista de “responsáveis do processo”, além de Carlos Eduardo Nunes Alves, aparecem também Flavio José de Andrade Rebouças, que era secretário do gabinete-civil do da SEJUC na época e assinou alguns dos primeiros contratos da secretaria. Francisco Dagmar Fernandes, que era coordenador do trabalho do SINE, também consta na relação. Segundo informações, todos os contratos também teriam sido autorizados pelo diretor-financeiro da Secretaria, João Josino do Forte Neto.
DISCURSO
A SEJUC foi a primeira experiência de Carlos Eduardo Alves como ordenador de despesa de um órgão público. Depois de ser eleito deputado estadual pelo PMDB e antes de ir integrar a chapa de Wilma de Faria na Prefeitura de Natal, o candidato agora do PDT foi o secretário de Justiça e Cidadania, por onde afirmou na semana passada que tinha passado sem se envolver em qualquer denúncia de irregularidade.
É válido lembrar também que Carlos Eduardo já respondeu por irregularidades ainda em 2008, ao vender a conta única da Prefeitura por R$ 40 milhões para pagar um saque feito na Previdência Social do Município, no valor de R$ 20 milhões. O ex-prefeito foi condenado em todas as instâncias do judiciário até chegar ao Supremo Tribunal Federal (STF), onde conseguiu uma liminar que o permitiu ressarcir os cofres públicos.
Além disso, Carlos Eduardo Alves foi o principal responsável pelas irregularidades que a Câmara Municipal de Natal (CMN) constatou na concessão de promoções e aumentos a servidores municipais em 2008, durante o período vedado, teoricamente, pela Lei de Responsabilidade Fiscal. Por isso, ele foi condenado pela Câmara, inclusive, com a constatação de dolo e má fé na prática de improbidade administrativa.  E, apesar de ser uma Casa política, a CMN tem autonomia e legitimidade para tal.

Fonte: Jornal de Hoje