Veja aqui a sentença na integra:


PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE.

COMARCA DE PATU – 37ª ZONA ELEITORAL.

Processo no 2323/2009.

Representantes: Coligação União e Trabalho ( PMDB, PDT, PP, PMN, PC do B e PPS ) e Alexandrino Suassuna Barreto Filho.

Representados: Coligação Justiça e Paz ( PSB, PV, PT, DEM e PR ), Evilásia Gildênia de Oliveira e Maria Gorete Forte Dantas.

REPRESENTAÇÃO ELEITORAL.

SENTENÇA.

Vistos.

A Coligação “União e Trabalho”, através de sua representante legal, Soraia Maria Azevedo, bem como o candidato Alexandrino Suassuna Barreto Filho, ajuizaram Representação Eleitoral com pedida de Antecipação de Tutela, contra Coligação “Justiça e Paz”, Evilásia Gildênia de Oliveira e Maria Gorete Forte Dantas, todos devidamente qualificados e representados por advogado.

Aduzem os postulantes, em síntese, que no dia 01.03.2009, durante os trabalhos da eleição suplementar para os cargos de Prefeito e Vice-Prefeito deste município, a pessoa de Damião Alves de Medeiros foi flagrado por policiais militares portando certa quantia em dinheiro.

De acordo com a exordial, o numerário foi fornecido ao respectivo eleitor pela pessoa de Evandro Carlos de Oliveira para que o mesmo votasse na então candidata Evilásia Gildênia de Oliveira.
Acompanham a inicial os documentos de fls. 26/106.
Em decisão de fls. 107/108 foi indeferida a medida de urgência.

Devidamente citados os representados apresentaram defesa ( fls. 124/140 ), ocasião em que refutam os fatos relatados na inicial ressaltando que no momento da prisão as partes envolvidas não mencionaram ter recebido dinheiro para votar nas representadas.

Prosseguindo, o andamento do feito restou sobrestado em razão da interposição de exceção de suspeição ( certidão de fls. 171 ), já julgada em definitivo pelo Tribunal Regional Eleitoral ( fls. 198/200 e 203 ).

Em audiência de instrução foram ouvidas duas testemunhas arroladas pelos representantes, tendo sido dispensada a oitiva das demais ( fls. 219/221 ).

Finalizando as partes apresentaram memoriais finais, os representantes afirmando que a produção probatória confirmou a existência da captação ilícita de sufrágio, pugnando pela procedência do pedido e os representados aduzindo, em suma, que que as provas não são suficientes para comprovar a prática de corrupção eleitoral pelos representados, ratificando os termos da contestação.

Parecer ministerial, com análise circunstanciada das provas, pela improcedência do pedido.

É o relatório. Decido.

Tratam os presentes autos de Ação de Investigação Judicial visando a apuração da prática de ato ilícito por parte da candidata Evilásia Gildênia de Oliveira e Maria Gorete Forte Dantas, que pleiteavam o cargo de Prefeito e Vice-Prefeito Municipal, nas eleições suplementares de 01.03.2009, tendo sido eleitas.

A ação imputada na inicial objetivamente relata que o Sr. Evandro Carlos de Oliveira Moura teria dado certa quantia em dinheiro a Damião Alves de Medeiros com o intuito de que este votasse nas candidatas, ora representadas. A hipótese, em tese, enquadra-se no artigo 41-A, da Lei 9504/97, que dispõe:

Art. 41-A – Ressalvado o disposto no art. 26 e seus incisos, constitui captação de sufrágio, vedada por esta Lei, o candidato doar, oferecer, prometer, ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição, inclusive, sob pena de multa de mil a cinqüenta mil UFIR, e cassação do registro ou diploma, observado o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar nº 64, de 18 de maio de 1990.

Tal dispositivo legal visa coibir a funesta prática, tal comum ainda em nosso país, em que os candidatos utilizam-se do poder econômico para conseguir votos, abusando da pobreza que assola o interior dos estados. Com isso o equilíbrio da disputa eleitoral é quebrado, ficando em larga vantagem aquele que dispõe de mais recursos financeiros, o que é vedado e punido por lei.
Sobre o tema Adriano Soares da Costa discorre “A vantagem que constitui captação de sufrágio é aquela que não é coletiva ( ou seja, que não é outorgada a um número indeterminado de pessoas ) e que visa a cooptar o voto de um eleitor específico, individualizado, e não o de uma comunidade difusa”. Ainda, segundo o mesmo autor “Ademais, é necessário que se demonstre, para a caracterização do ilícito, que a finalidade da vantagem oferecida ou efetivamente dada seja a captação de sufrágio, é dizer, tenha fins explicitamente eleitorais. Não basta se provar que houve a oferta de ganho, ou que tenha havido a entrega de algum bem ao eleitor individualmente caracterizado: é fundamental que haja a demonstração de que esse benefício, ou promessa de benefício, tenha a finalidade eleitoral de cooptar a sua vontade. Sem esse plus, não estará também configurada a captação ilícita de sufrágio, consoante já se pronunciou o Tribunal Superior Eleitoral ( RE 19.229/MG, rel. Min. Fernando Neves, em 15.02.01, Informativo TSE, ano III, n. 2, 12 a 18 de fevereiro de 2001, p. 1)”.
Logo, para que a sanção legal possa ser aplicada afastando-se o candidato que foi eleito faz-se necessário a comprovação em juízo de uma das ações ilícitas descritas no artigo 41-A da Lei 9504/97, o elemento subjetivo consistente na troca da dádiva pelo voto, bem como a participação direta ou indireta do candidato para o evento. Tais requisitos não se sustentam diante do acervo probatório, como bem fundamentado pelo representante do Ministério Público.
Não resta dúvida de que Evandro Carlos Oliveira Moura entregou a quantia de R$ 140,00 ( cento e quarenta reais ) a Damião Alves de Medeiros no dia 01.03.2009, data do último pleito municipal. Este fato é confirmado no Auto de Prisão em Flagrante e pelos policiais ouvidos em juízo. Também é certo que Evandro Carlos Oliveira Moura atuou efetivamente na campanha da candidata Evilásia Gildênia de Oliveira, com quem mantém laços afetivos. Entretanto, as provas não demonstram que o numerário foi dado em troca de votos e muito menos que houve a anuência das beneficiárias. Vejamos.
No dia dos fatos, segundo os policiais que efetuaram a prisão em flagrante, teria havido denúncia anônima de que em local próximo à residência de Evandro estaria sendo distribuído dinheiro em troca de votos, o que fez com que os mesmos ficassem de campana. Posteriormente, ao verificarem que Damião saía da residência mencionada fizeram a abordagem e encontraram com o mesmo o valor acima descrito e, segundo o PM Luiz Jerônimo Rezende, Damião teria dito que o dinheiro tinha sido oferecido por Evandro a fim de que votasse em Evilásia. Entretanto, o outro policial que também participou da operação, Francisco Sigmar de Oliveira, em nenhum momento afirmou ter ouvido Damião mencionar que o dinheiro teria sido dado em troca de votos, ao contrário, afirma que Damião relatou, naquele momento, ter recebido a quantia a fim de custear transporte e lanche.

Retornando ao flagrante constata-se que Damião fazia-se acompanhar de mais duas pessoas, Maria Celma Alves de Medeiros e Maria Audinez Andrade ( fls. 65/66 e 69/70 ) tendo as mesmas afirmado:

“...QUE, esteve presente no momento em que EVANDRO entregou o dinheiro a DAMIÃO, sabendo precisar que o primeiro não fez qualquer ressalva sobre as razões da entrega daquele dinheiro, inclusive sabendo que não era para destinação eleitoral; QUE, não sabe precisar o valor que o Sr. DAMIÃO recebeu do Sr. EVANDRO, sabendo entretanto que tal quantia deveria ser repartida por cerca de sete pessoas, dentre as quais irmãs e cunhado da declarante” ( fls. 65/66 ).

“...QUE sabe quanto custa a passagem de Mossoró para Patu, afirmando que custa R$ 12,00; QUE, ressalta, na verdade, que os valores foram pagos por EVANDRO e que o veículo passou na casa do sogro da mesma pegando-a juntamente com mais cinco pessoas, sendo elas: MARIA CELMA, MARIA DO CÉU, VERACILDA e DAMIÃO, todos da familia da declarante, afirmando que EVANDRO também pagou as passagens das demais pessoas (...) QUE, sabe que o seu marido Sr. DAMIÃO recebeu uma quantia em dinheiro do Sr. EVANDRO, não sabendo dizer qual a quantia; QUE, não sabe dizer por que seu marido recebeu o dinheiro (...) QUE em momento algum recebeu dinheiro para votar...” ( fls. 69/70 ).

Assim, a única pessoa que teria ouvido Damião mencionar o recebimento de dinheiro em troca de voto seria o policial militar Luiz Jerônimo Rezende que, em decorrência da profissão exercida, merece a credibilidade da justiça, até mesmo porque está lotado em outra unidade próxima e, ao que parece não tem laços afetivos ou profissionais neste município. Entretanto, essa afirmação isolada não tem o condão de convencer o juízo da real existência de corrupção eleitoral, notadamente em razão de Damião ter feito tal assertiva, segundo o policial, no momento em que estava detido na viatura policial e, portanto, abalado emocionalmente ( fls. 72 ).
Finalmente, o valor apreendido em poder de Evandro ( R$ 210,00) , em quatro cédulas de R$ 50,00 ( cinquenta reais ) e uma de R$ 10,00 ( dez reais ) não é indicativo de conduta dolosa no sentido de distribuição de numerário em troca de votos, tanto que o representante do Ministério Público que atuava na Comarca de Patu à época, ao oferecer denúncia enquadrou os fatos no crime de transporte irregular de eleitores.

As demais provas documentais que acompanham a inicial não servem a demonstrar o fato específico em análise, pois dizem respeito a situações genéricas.

Concluindo, exceto o depoimento do policial militar Luiz Jerônimo que teria ouvido Damião mencionar o recebimento do dinheiro em troca de voto e, repita-se, em uma situação excepcional, nada mais há nos autos a comprovar a captação ilícita de sufrágio. Muito menos em relação a participação da candidata no evento, pois quanto ao vínculo subjetivo não há sequer indícios.

Sendo assim, o conjunto probatório não incute no espírito do julgador certeza quanto a ocorrência dos fatos narrados na inicial, não podendo ser prolatada sentença de procedência da ação imputando ao representado uma sanção, baseada apenas em indícios. Neste sentido jurisprudência recente do TSE ( RO – 1525, Relator Ministro Felix Fischer, DJE 12.06.2009, página 108/111 ).

Uma vez prolatada sentença não mais se justifica o segredo de justiça imposto pelo juízo a fim de resguardar a lisura dos depoimentos testemunhais, tornando-se pública a presente ação.

Isto posto, em conformidade com o parecer ministerial, julgo IMPROCEDENTE o pedido inicial.

P.R.I.

Patu, 02 de setembro de 2009.

Gisela Besch

Juíza Eleitoral