Começou nesta quarta-feira (20) um estudo que, pela primeira vez, reúne técnicos fundiários de Piauí e Ceará para tentar pôr um fim a um problema de mais um século na divisa entre os dois Estados. Vinte e dois municípios estão na região em conflito, sem definição exata de território, esperando por uma definição.


A disputa não inclui judeus e palestinos, mas a briga por áreas fez o local ganhar o apelido de "Faixa de Gaza" do Nordeste. O local questionado fica na serra da Ibiapaba, com extensão norte-sul de 425 km. Ao todo, 13 municípios cearenses e nove piauienses terão seus limites analisados.
A disputa por territórios teve origem em 1880, com o decreto imperial de Dom Pedro 2º, que formalizou uma troca de terras em o Ceará cedeu parte do litoral por um pedaço de terras do Piauí. A partir daquele momento não houve acordo, e a população se tornou vítima de um descaso histórico.
Nesses municípios, é comum moradores reclamarem da falta de assistência médica e educacional, por exemplo, pois os governos não investem no local por conta das indefinições. É comum eleitores de um mesmo povoado votarem em Estados diferentes por conta do endereço apresentado à Justiça Eleitoral.
Diante de impasses, o caso foi parar no STF (Supremo Tribunal Federal) em outubro de 2011, quando o governo piauiense deixou de lado as tentativas de negociação frustradas para tentar recuperar terras que seriam do lado oeste, mas que estão em poder cearense. Uma ação cível originária, nome técnico, foi ingressada pela Procuradoria do Estado cobrando uma área de 2.821 km².
Antes de julgar o caso, o STF decidiu mandar o caso para a câmara de conciliação, a fim de que os dois Estados sentassem, com mediação da Justiça, para chegar a um consenso, sem a necessidade de intervenção jurídica.

Sem consenso

Segundo a diretora técnica fundiária do Interpi (Instituto de Terras do Piauí), Regina Lourdes de Araújo, o primeiro passo para tentativa de conciliação veio com o Exército, que fez um levantamento para delimitação da área em conflito. Porém, mais uma vez, houve divergência dos dois lados.
"Nenhum dos Estados concordou com as delimitações. Na definição que foi feita, alguns municípios  que estavam ficando com o Ceará. No caso deles, acho que também eles questionaram outras comunidades que ficaram Piauí. Entrou-se, então, em um acordo para se fazer um estudo de campo", disse Araújo.
A diretora afirmou ao UOL que essa é a primeira que um estudo será feito com especialistas dos dois Estados para tentarse chegar a um acordo.  "Tecnicamente, essa é a primeira vez que nós, do Interpi, participamos de um estudo junto com o Ceará. Estamos com um engenheiro agrimensor no local", disse.
Segundo o Ipece (Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará), o objetivo do trabalho de campo é identificar, reconhecer e delimitar a divisa entre os dois Estados e vai seguir até o próximo dia oito. Pelo lado cearense, participam técnicos do Ipece e do Instituto do Desenvolvimento Agrário do Ceará. Já pelo Estado do Piauí, a equipe conta Interpi e Fundação Centro de Pesquisas Econômicas e Sociais do Piauí. A coordenação dos trabalhos é do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), a quem cabe a responsabilidade de dirimir questões de limites interestaduais é da União.
"O objetivo do trabalho é subsidiar o IBGE de informações para que o conflito de limites geográficos entre o Ceará e Piauí seja solucionado pela União, facilitando, dessa forma, a identificação, reconhecimento e delimitação da divisa entre os dois estados, tendo em vista que serão realizadas atividades de análise em gabinete do material cartográfico e do descritivo da divisa, bem como inspeções e levantamento de informações em campo, sendo essa última etapa de importância fundamental", informou o órgão, em nota.
Inicialmente serão analisados aproximadamente 30 quilômetros, entre os municípios de Poranga (CE) e Pedro II (PI). Após isso, a análise vai percorrer todos os 425 km em questão.
O Ipece informou ainda que realiza uma licitação para aquisição de imagens de satélites em alta resolução de todo o Ceará, incluindo as áreas de divisa com o Piauí, para subsidiar o trabalho de campo.
UOL