Roberta Trindade - repórter

Um  trabalhador que ajudou a polícia a evitar um dos maiores assaltos à carro-forte em Natal e a desarticular uma quadrilha perigosa que agia no Rio Grande do Norte está desempregado, acuado, desamparado e esquecido pelo poder público do Rio Grande do Norte. Wellington Lima de Farias, 22 anos, é vítima de um sistema que não funciona. Ao denunciar os assaltantes, ele cumpriu o papel de um bom cidadão para, depois, constatar que o poder público e o sistema dito de “segurança pública e defesa social” não parece valorizar nem recompensar tais atitudes.  
Adriano AbreuA ação policial ocorrida no ano passado evitou que um carro forte fosse roubado. Mas após a prisão do bando, o trabalhador que auxiliou a polícia, foi esquecidoA ação policial ocorrida no ano passado evitou que um carro forte fosse roubado. Mas após a prisão do bando, o trabalhador que auxiliou a polícia, foi esquecido
A vida do jovem que parecia ser normal como a de qualquer outro garoto da mesma idade mudou “como um passe de mágica” e se tornou um pesadelo. Deprimido, à espera de algum tipo “justiça”, Wellington vive sustentado pela família que sofre junto com o trabalhador, várias vezes ameaçado de morte. 

Até o ano passado, Wellington era funcionário da empresa Sena Terceirização de Serviços Limitada e prestava serviço como auxiliar operacional no supermercado Hiper BomPreço da avenida Alexandrino de Alencar, em Morro Branco.  Uma das funções dele era preencher uma planilha com os horários de chegada e saída do carro-forte no supermercado e a quantidade de malotes que abasteciam o carro-forte.

A informação era valiosa para uma quadrilha que planejava assaltar o carro-forte. Três meses antes da data marcada pelos assaltantes para o ataque, Wellington foi abordado durante o trabalho (no estacionamento do Hiper Bompreço) por três homens que estavam em um veículo Gol – dois deles utilizavam armas. “O motorista desceu e disse que queria que eu colaborasse. Que precisava de algumas informações e que se eu não ajudasse me mataria e a minha família também”.

Wellington disse que, na hora, ficou desesperado. Apesar das ameaças, os bandidos prometeram “um carro zero” se ele colaborasse e disseram que “dariam um tempo para ele se decidir”. “O carro-forte chegava sempre por volta das 10h30. Eles também queriam saber qual o melhor dia para roubar. Quando recebiam o maior número de malotes”. Segundo Wellington, os bandidos haviam conseguido até o número de telefone celular dele e começaram a ligar. “Eles me ligaram algumas vezes. Depois passei a não atender as ligações. Me pegaram na rua”.

Passados 20 dias da abordagem dos criminosos à Wellington ele foi mais uma vez ameaçado de morte. “Colocaram uma arma na minha boca e obrigaram que eu colaborasse”.  Foi depois desta segunda ameaça que Wellington comunicou o fato à gerencia do Hiper BomPreço que, por sua vez, acionou a Sena Terceirização. A polícia foi avisada. De acordo com relatos do trabalhador ele foi orientado pela polícia a atender a quadrilha e passar as informações que fossem necessárias para que os planos de assalto ao carro-forte fossem levados adiante. Uma operação policial seria montada para surpreender os bandidos.

A gerência do Hiper Bompreço e da Sena garantiram, segundo  Wellington, todo o apoio necessário e que ele seria transferido para outro Estado, após encerrado o episódio. Ainda de acordo com o trabalhador foi um dos chefes da Sena Terceirização de Serviços Limitada que avisou a polícia do assalto.

A ação da quadrilha ficou marcada para manhã do dia 7 de agosto  de 2009 (sexta-feira). Neste dia, o carro forte deveria transportar entre R$ 300 e R$ 400 mil. Até o dia marcado para a ação da quadrilha, Wellington manteve vários encontros com integrantes do bando. Sempre orientado pela polícia, ele passava as informações que os bandidos queriam, fingia colaborar e lançava a isca para a operação policial.

Neste trabalho, acabou ajudando também na identificação de vários dos envolvidos no plano de assalto. Sem qualquer preparação, conhecimento do trabalho policial ou treinamento específico sobre ações de informação – apenas acreditando que essa era a coisa certa a ser feita – Wellington atuou como “um infiltrado” na quadrilha. O risco que correu, na ocasião, não o incomoda mais. Hoje, em casa, acuado pelo medo e a certeza que poderá se morto a qualquer momento; desempregado e sem poder se manter financeiramente; desencantado em relação aos antigos patrões, à policia e ao Judiciário – a quem chegou a pedir ajuda – Wellington chora diante da reportagem. As lágrimas não são de arrependimento. São de dor … pelo futuro incerto e sombrio.

Quadrilha foi presa em agosto de 2009

Policiais civis abortaram na manhã da sexta-feira – 7 de agosto de 2009 – a ação de uma quadrilha perigosa e bem estruturada. O assalto aconteceria à um carro-forte dentro do estacionamento do supermercado Hiper Bompreço, na avenida Alexandrino de Alencar, em Barro Vermelho. Cinco membros do bando estavam dentro do estacionamento em um veículo Celta de cor vermelha e placas MYT 4857 (teria sido roubado no dia anterior em Cidade Jardim).

Outros bandidos aguardavam do lado de fora em um outro carro. Houve tiroteio e três assaltantes morreram no local. Heberton Xavier da Silva, 29, Kelson da Silva Pereira, 29 e João Maria Braz da Silva, 27. Luiz Paulo de Lima, 25 foi atingido com um tiro no pé e Rogério Nascimento da Silva, 29 (ele não foi baleado). Um policial teve ferimentos leves.    

Homens da PM, fortemente armados, isolaram parte da avenida Alexandrino de Alencar e ruas adjacentes. O trânsito precisou ser desviado.  O helicóptero da Secretária de Segurança Pública e Defesa Social sobrevoou a área.

Informações davam conta que dois assaltantes (que também estavam no local conseguiram fugir). Até hoje estes homens não foram presos pela cúpula da Polícia. Os dois presos estariam detidos na Penitenciária Estadual de Alcaçuz, em Nísia Floresta.

Na época, o delegado geral da Polícia Civil, Elias Nobre, enfatizou o trabalho dos policiais e disse que cinco delegados e 25 agentes trabalharam no caso.

Entre os delegados que participaram da ação para combater a quadrilha estavam: Ronaldo Gomes (um dos mais experientes do Estado), titular da Divisão de Combate em Investigação ao Crime Organizado, Atanásio Gomes, adjunto da Delegacia Especializada em Furtos e Roubos e Márcio Delgado ( também da Deicor).   

O ex-secretário de Segurança Pública e Defesa Social, Agripino de Oliveira Neto em entrevista à Tribuna do Norte afirmou que o bando era altamente perigoso e que todos seriam do regime semi-aberto.  

Kelson (era foragido) foi acusado pela polícia de envolvimento em um assalto na guarita da Base Aérea de Natal, em 22 de abril de 2008.

Luiz Paulo havia sido liberado da Penitenciária Estadual de Alcaçuz uma semana antes da tentativa de assalto. Os outros, segundo a polícia tinham envolvimento com droga e outros assaltos.

Empresa demitiu Wellington dois dias após a ação

Wellington afirma que a Sena Terceirização de Serviços Limitada, assim como o Hiper Bompreço prometeram que ele não seria prejudicado e que ajudando a polícia não ficaria desassistido.

A ação da polícia contra os bandidos ocorreu no dia 07 de agosto de 2009. O que Wellington não esperava é que todas as promessas feitas a ele pelas empresas – incluindo uma garantia de trabalho e mudança de Estado – fossem esquecidas.

Dois dias depois do ocorrido no estacionamento do supermercado Hiper Bompreço, Wellington foi demitido. “Me telefonaram e pediram para que eu fosse até a Sena. Lá fui informado de que havia sido dispensado porque a empresa não precisava mais dos meus serviços”.

A mãe de Wellington, que preferiu não se identificar, contou que o filho entrou em depressão. “Ele ficou doente mesmo. Primeiro porque não conseguia dormir por ter sido, durante tanto tempo (três meses) ameaçado pelos bandidos, depois por ter sido demitido”, desabafou a mulher, desesperada com a situação do filho. 

Por meio do advogado Josué Jordão Mendes Júnior, o ex-funcionário da Sena Terceirização entrou com um processo trabalhista contra a Sena. O processo de número 94300-92.2010.5.21.001 tramita na 1ª Vara Trabalhista, no fórum de Lagoa Nova. O advogado do reclamante pediu uma indenização de R$ 700 mil pelos danos morais causados ao auxiliar operacional. O pedido deve ser julgado nos próximos dias pela juíza Maria Rita Manzana de Moura Garcia.

Somente a magistrada poderá decidir se o valor pedido na ação é alto ou baixo e se Wellinton tem ou não direito a ser ressarcido pelos danos sofridos, porém, o que a reportagem da Tribuna do Norte presenciou ao conversar com o trabalhador foi um jovem que acreditou no poder público e que hoje não tem direito sequer a viver normalmente como qualquer outro jovem da mesma idade.

No último dia 27 de setembro, às 11h20 conforme consta no site do Tribunal Regional do Trabalho foi realizada a audiência na 1ª Vara. Wellington foi ouvido pela magistrada, assim como uma das testemunhas dos fatos. 
 
Fonte: Tribuna do Norte